12/11/2015
By Carol Beuchat PhD
A displasia de quadril (ou displasia coxo femoral) é um tema recorrente quando o assunto são cães, e tem sido assim pelos últimos 50 anos. Os pesquisadores têm trabalhado duro durante décadas a procura de soluções, e os criadores têm feito o seu melhor para reduzir o risco de produzir filhotes afetados. Mas, ainda assim, o problema permanece.
Existem algumas coisas simples que poderíamos fazer para reduzir a incidência de displasia de quadril desde já, se entendermos alguns itens básicos.
Aqui estão as 10 coisas mais importantes que você precisa saber.
1) Todos os filhotes nascem com quadris perfeitamente normais
A displasia de quadril não é um defeito congênito; não está presente no nascimento. Vários estudos demonstraram que todos os filhotes normais nascem com quadris “perfeitos”; ou seja, são “normais” para um recém-nascido, sem sinais de displasia. As estruturas da articulação do quadril são cartilagens por ocasião do nascimento e só se tornam ossos com o crescimento do filhote. Se um filhote desenvolverá displasia de quadril, o processo começará logo após o nascimento.
Esta é a articulação do quadril de um cachorro de 1 dia de idade. O tecido da cartilagem não aparece em uma radiografia até a deposição dos minerais que formam o osso. O desenvolvimento adequado da articulação depende da manutenção do encaixe adequado entre a cabeça do fêmur e a cavidade (acetábulo).
“As articulações de quadril de todos os cães são normais ao nascimento. As articulações continuam a se desenvolver normalmente, enquanto a congruidade completa é mantida entre o acetábulo e cabeça do fêmur… As bordas acetabulares são estimuladas a crescer por leve tração aplicada pela cápsula articular e pelos músculos glúteos ligados ao longo de suas bordas dorsais, e ainda pela pressão das cabeças femorais sobre as superfícies articulares … As características morfológicas da estrutura complexa do quadril mostram que o comportamento biomecânico é a principal influência no crescimento dessa articulação.” (Riser 1985)
2) Os genes que causam displasia de quadril permanecem um mistério
A displasia de quadril tende a ser mais comum em algumas raças e em algumas linhas de sangue do que em
outras, o que indica que há um componente genético para o defeito. No entanto, cientistas têm procurado
os genes responsáveis pelo desenvolvimento da displasia de quadril em cães, por décadas, sem sucesso.
Em alguns genes foram identificadas variações na sequência do DNA associadas com a displasia de quadril,
em algumas raças essas variantes gênicas, entretanto, mas são específicas; ou seja, o conjunto de genes que
apresentam variação, é diferente em cada raça. Por exemplo, ver estudos sobre o pastor alemão (Marschall
& Distl 2007, Fells & Distl 2014 e Fels et al 2014), o Bernese – Boiadeiro Bernês (Pfahler & Distl 2012) e o
Labrador Retriever (Phavaphutanon et al 2008). Genes cujas alterações são definitivamente causa de
displasia de quadril não foram encontrados em qualquer raça de canina.
É improvável que os pesquisadores venham a descobrir uma solução genética fácil para o problema da
displasia de quadril. Trata-se de característica complexa, ou seja, que é influenciada por genes e pelo
ambiente, e não há solução simples no horizonte. Devemos ser capazes de fazer melhoramento genético
usando estratégias de seleção que sejam tão eficientes e eficazes quanto possível, como os valores
estimados de reprodução, EBVs. Uma grande vantagem do uso do EBVs é que os genes responsáveis por
uma característica não precisam ser conhecidos; você precisa apenas de um banco de dados de pedigrees e
informações sobre os animais afetados.
3) Fatores ambientais também são importantes
Embora haja uma influência genética na displasia do quadril, a herdabilidade dessa característica é baixa. Vários estudos demonstraram que a variabilidade genética é responsável por apenas uma fração modesta da variabilidade na qualidade do quadril, geralmente 15-40%. Isso significa que parte da variabilidade na qualidade dos quadris resulta de influências não genéticas ou “ambientais”. Essa é uma das razões por que décadas de forte seleção resultaram, em apenas modestas reduções na displasia do quadril em algumas raças. Na taxa atual de progresso e selecionando apenas pelo fenótipo, poderia levar décadas para se conseguir uma redução significativa na incidência da displasia de quadril (Lewis et al 2013).
Compreender os fatores ambientais específicos que desempenham um papel no desenvolvimento da displasia de quadril deve permitir a redução do número de animais afetados pela displasia, mesmo que a base genética ainda não seja compreendida. Isso reduziria dor e sofrimento significativos, bem como os custos e o sofrimento que os proprietários de um cão afetado têm que enfrentar. Não há razão que justifique não tomar medidas ativas para fazer isso desde já.
Os três principais fatores ambientais identificados, com papel significativo no desenvolvimento de quadris displásicos, são: a) frouxidão articular, b) peso, e c) exercício (ver abaixo).
4) A frouxidão articular é a causa primária da displasia de quadril
Os filhotes nascem com quadris perfeitos, e, se os quadris não desenvolverem frouxidão articular, o cão não
desenvolve displasia de quadril (Riser 1985). A frouxidão articular ocorre quando a cabeça do fêmur não
encaixa perfeitamente no acetábulo. Isso pode ser o resultado de lesões traumáticas, sobrecarga da
articulação por sobrepeso, falta de força muscular ou forças adutoras (por exemplo, junção das pernas). A
frouxidão articular é o principal fator que predispõe um cão ao desenvolvimento de displasia de quadril.
Em cães, assim como em muitos outros vertebrados (incluindo seres humanos), a cabeça do fêmur em
recém-nascidos é mantida firmemente no lugar por um ligamento forte chamado de “ligamento redondo”
ou “ligamento teres” (ligamento da cabeça do fêmur).
Uma extremidade desse ligamento é unida à cabeça do fêmur e a outra extremidade à parede interna do
acetábulo (o receptáculo em forma de copo na pelve).
Você pode ver o ligamento teres (ligamento da cabeça do fêmur) nesta ilustração:
Se este ligamento for danificado ou cortado, o fêmur não será mantido firmemente no soquete, o que fará com que a articulação se apresenta “solta”.
Se a cabeça femoral não estiver posicionada corretamente no soquete, as forças no quadril serão anormais. Em vez de serem distribuídas através da superfície interna do encaixe, as forças na junção serão concentradas numa área menor no bordo mais fraco do acetábulo. O resultado será danos à borda do soquete, quando uma carga é colocada sobre a articulação coxofemoral.
5) Controle da estabilidade das articulações é fundamental
O ligamento teres deve manter a cabeça do fêmur firmemente no acetábulo do filhote canino em
crescimento, enquanto os músculos que irão apoiar o quadril se desenvolvem e se tornam mais fortes. Mas,
em alguns filhotes, o ligamento mostra evidência de dano antes mesmo de um mês de idade (Riser 1985).
“Os ligamentos teres das articulações do quadril estavam edematosos [inchados], algumas fibras do
ligamento foram rompidas, e hemorragia capilar pontilhava a superfície dos ligamentos no ponto da
dilaceração. Essas alterações foram consideradas os primeiros sinais que podem estar ligados a displasia de
quadril”.
As forças anormais no fêmur e no acetábulo causadas pela frouxidão articular resultam no trauma que causa
displasia de quadril e osteoartrite do quadril.
“Não há evidências de que exista um defeito ósseo primário, mas sim a doença é uma falha dos músculos e
outros tecidos moles para manter a articulação do quadril em plena congruidade. Isto é ainda apoiado pelo
fato de que a displasia óssea pode ser aumentada, diminuída, ou impedida pelo controle do grau de
instabilidade articular e incongruência. Não há outras malformações associadas com a doença. Uma relação
causal entre músculos e defeitos de tecidos moles ou alterações patológicas que não a falta de massa
muscular ou força não foi estabelecida… A displasia de quadril é uma concentração de fatores, um conjunto
de alterações genéticas e estresses ambientais incluídos em um padrão programado de remodelamento
progressivo e doença articular degenerativa. (Riser 1985)
6) O peso corporal é um fator ambiental MAIOR
Se houver frouxidão na articulação do quadril, a quantidade de dano ao fêmur e ao acetábulo dependerá da
magnitude das forças na articulação do quadril. Quanto mais pesado o cão, maiores as forças serão e
também, portanto, maior o risco de displasia de quadril e osteoartrite.
Os cachorros que pesam mais ao nascer, bem como aqueles com taxas de crescimento mais altas (de modo
que ficam mais pesados mais cedo), têm um maior risco de alterações degenerativas na articulação do
quadril (Vanden Berg-Foels et al 2006).
Como mostra este gráfico, filhotes mantidos em uma dieta restrita (linha cinza) têm um risco drasticamente
menor de displasia e a desenvolvem muito mais tarde na vida do que cachorros mantidos com dietas de
controle (linha preta) (Smith et al 2006).
Aos quatro anos de idade, menos de 10% dos cães submetidos a uma dieta restrita (25% menos do que a
dieta de controle) eram displásicos, ao mesmo tempo em que mais de 30% dos cães do grupo de controle
eram displásicos. Como vantagem adicional, cães em dietas restritas vivem mais tempo (Kealy et al 2002)!
Infelizmente, muitos cães (incluindo os de exposição) estão acima do peso (McGreevy et al 2005, Corbee
2013), e obesidade poderia muito bem ser o mais significativo fator ambiental único que acarretaria o
desenvolvimento de displasia de quadril e osteoartrite. Mas peso corporal é fator que podemos controlar.
Embora o progresso da seleção genética leve muitas gerações, a incidência de displasia de quadril em cães
poderia ser imediata e dramaticamente reduzida simplesmente praticando um melhor controle de peso.
7) O exercício é bom e ruim
O exercício fortalece os músculos das pernas e pélvis, o que irá aumentar a estabilidade da articulação do
quadril. Mas todo o exercício não é igualmente desejável.
Os filhotes criados em superfícies escorregadias ou com acesso a escadas, com menos de 3 meses de idade,
têm um maior risco de desenvolver displasia de quadril, enquanto aqueles aos quais são permitidos
exercícios em terreno macio e irregular (como em um parque) e têm um menor risco (Krontveit et al 2012).
Os cães nascidos no verão têm um menor risco de desenvolver displasia de quadril, presumivelmente
porque eles têm mais oportunidade de exercitar-se ao ar livre (Ktontveit et al 2012). Por outro lado, cães de
12 a 24 meses de idade que perseguem regularmente uma bola ou pedaço de madeira lançados pelo dono
têm maior risco de desenvolver quadris displásicos (Sallander et al 2006).
O período mais crítico para o crescimento e o desenvolvimento adequados do quadril em cães é do
nascimento até 8 semanas de idade, de modo que o tipo de exercício a que os filhotes são expostos é mais
importante nesse período.
8) A nutrição é importante
Enquanto filhotes estão crescendo rapidamente, é extremamente importante que tenham nutrição correta.
Os filhotes em crescimento precisam comer o suficiente para apoiar o crescimento, mas não devem ser
gordos, porque qualquer peso extra pode aumentar o risco de desenvolver displasia de quadris (Hedhammar
et al 1975, Kasstrom 1975). Um problema adicional é que os filhotes, recebendo muito alimento, também
podem consumir doses excessivas de nutrientes específicos. Os filhotes alimentados com alimento comercial
de qualidade e na quantidade apropriada, terão uma dieta nutricionalmente equilibrada e não devem
receber qualquer suplemento. Os suplementos dietéticos, especialmente de cálcio, não são apenas
desnecessários, mas podem causar sérios problemas. Não existem evidências de que a suplementação de
proteínas ou vitaminas reduza o risco de displasia de quadril. Kealy et al 1991, Nap et al 1991,
Richardson&Zentek 1998
9) A intervenção precoce é crítica
A maioria dos tratamentos para a displasia de quadril é mais fácil e mais bem sucedida em cães mais jovens.
Se os sintomas iniciais forem ignorados e a triagem for feita somente após 24 meses ou mais, a janela de
tempo com melhor prognóstico em resposta ao tratamento terá passado (Morgan et al 2000). Sinais de
claudicação geralmente aparecem pela primeira vez quando o filhote tem de 4 a 6 meses de idade, mas
depois de um mês ou dois, o cão muitas vezes parece melhor. Isso acontece porque o dano à borda
acetabular como microcfraturas estará curado e o cão já não sentirá dor, mas o desenvolvimento da
displasia e da osteoartrite continuará. A partir daí, o cão pode não apresentar novamente sinais clínicos
durante anos, enquanto o dano patológico avança.
A frouxidão na articulação pode ser determinada tão cedo quanto 4 meses de idade (por apalpação ou Penn
HIP). Se detectada precocemente, a intervenção para mitigar dano adicional pode incluir perda de peso,
modificação do exercício e das atividades, ou cirurgia – mas deve ser feito antes do crescimento esquelético
completo. Os criadores devem educar os novos proprietários de filhotes quanto aos fatores que podem
aumentar o risco de desenvolver displasia de quadril e também aconselhá-los a obter um exame veterinário
imediatamente, se houver qualquer sinal de claudicação.
10) Podemos reduzir drasticamente a displasia de quadril agora
A seleção genética deve continuar a produzir progresso modesto na redução da displasia de quadril. Mas,
redução significativa e imediata no número de animais afetados poderia ser alcançada por um melhor
controle de fatores ambientais. Monitoramento de peso exercício adequado, nutrição adequada e
intervenção precoce ao primeiro sinal de claudicação são atitudes simples que podemos tomar e irão reduzir
drasticamente a dor e o sofrimento causados pela displasia de quadril. A pesquisa certamente continuará,
mas já temos as informações de que precisamos para atacar esse problema.
“Retirado do link: https://clubepastoralemao.com/
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